Caminho das pedras
por Abilio Pacheco
Essa
é uma expressão muito comum em se tratando de dar dicas para quem quer se
tornar um escritor (literário) ou para quem quer seguir uma profissão que exige
algo mais que a técnica. Já é mais do que óbvio, posto já ser deveras repetido,
que para se tornar um bom escritor, o ideal é ler, ler bastante. Acrescento
ainda que o ideal é ler bastante do gênero de texto que você pretende escrever.
Para ser um bom poeta, leia bons poetas. Para ser um bom romancista, leia os
bons romancistas.
No
finzinho da adolescência, fui cheio de espinhas, empacotado num macacão do
SENAI até o campus da Universidade Federal do Pará em Marabá procurar um
professor de Literatura para ele me sugerir algum livro (teórico – acho que eu
queria um manual ou algo assim) que me ensinasse a escrever poesia. O professor
Gilson Penalva, que mais tarde de seria meu orientador de monitoria, exatamente
da disciplina Teoria Literária, desconversou, disse-me da inutilidade que seria
a teoria, que não haveria material didatizado sobre o assunto e, como eu
insisti, terminou me encaminhando para um outro profissional do magistério.
Sugeriu que eu fosse falar com uma professora do ensino médio de uma escola
estadual.
Ora,
eu não sou metade do que o Gilson era já naquela época, mas me mostro, além de
professor de literatura, escritor. Talvez por isso vez por outra alguém vem me
perguntar o tal caminho das pedras, como se eu realmente o soubesse ou já
tivesse trilhado por ele. Já disse que o ideal é ler bastante do gênero que
você quer aprender, ou se dedicar, mas acredito que os relatos dos autores
sobre a produção de seus romances também são bons passos entre penedos. Não
exatamente as autobiografias ou memórias, embora alguns capítulos catando entre
banalidades seja possível encontrar algo proveitoso, como o capítulo 4 do livro
O texto, ou: a vida – uma trajetória literária[1],
de Moacyr Scliar.
Aliás,
o capítulo todo não, somente a partir da página 124. O livro de Moacyr Scliar,
como bem diz o subtítulo, não é uma biografia, mas sim um memorial em que
relata de sua trajetória de vida no que se refere à atividade de escritor. Algo parecido com o que fez Manuel Bandeira em
seu Itinerário de Pasárgada (aos que querem trilhar o caminho das pedras
da poesia sugiro este e também Cartas a um jovem poeta, de Rainer Maria
Rilke).
Aos
leitores que desejam ser romancistas seguem as sugestões que longe de serem
dicas, mas parecem um roteiro de leituras a obedecer praticamente em ordem
didática. Comecem por dois textos de romancistas brasileiros do século XIX: Como
e porque sou romancista[2],
de José de Alencar, e Instinto de Nacionalidade[3],
de Machado de Assis. O texto de Alencar reforça a minha afirmação sobre a
importância do contato com o gênero ao qual se quer dedicar o jovem escritor.
Alencar era o leitor da casa quando no “horário nobre” não havia televisão; na
época, sentava-se a ouvir a leitura das novelas e romances de folhetim,
principalmente de autores franceses e ingleses. E “foi essa leitura contínua e
repetida de novelas e romances que primeiro imprimiu em meu espírito a
tendência para essa forma literária que é entre todas a de minha predileção?”,
Alencar se pergunta meio que afirmando. Já o texto de Machado de Assis serve
principalmente para neófitos que moram regiões não hegemônicas, como os meus
autores “patrícios” da Amazônia, e mais ainda da Amazônia Paraense (existe
isso?), que querem porque querem escrever sobre... a Amazônia. Uma vontade
imperiosa de cantar, escrever, elogiar, fotografar, registrar, divulgar o
torrão natal. Deve-se – creio eu – cantar os dramas humanos que acontecem em
qualquer lugares ou época. O romancista deve se preocupar também com a boa
urdidura da trama, com a construção dos personagens, com os efeitos causados
pelo narrador. Descrições quase sem fim são descartáveis e o espaço na maioria
das vezes um mero complemento.
Ainda
na literatura brasileira sugiro a leitura do romance O risco do bordado,
de Autran Dourado, e o livro Uma poética de romance, do
mesmo autor
[1] André Luis Mansur publicou uma boa crítica/resenha/comentário a este
livro: [http://criticasmansur.blogspot.com/2010/05/o-texto-ou-vida-de-moacyr-scliar_7644.html]
[2] O download dessa obra pode ser feito em: [http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000311.pdf]
[3] O download pode ser feito em: [http://www.ufrgs.br/cdrom/assis/massis.pdf]
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